quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O SÁBIO CAVALEIRO

   Era um homem alto, forte, possuía cabelos loiros e olhos azuis. Seu corpo era marcado por diversas cicatrizes e seu olhar trazia consigo um misto de dor e orgulho, um olhar que daria medo até nas criaturas mais vis. Tal homem cavalgava em seu forte cavalo, seguido pelo seu novo e recém-arranjado escudeiro, tal que o último veio a falecer em uma de suas batalhas.

   Já à beira de um rio, os dois pararam para descansar. O cavaleiro tirou sua pesada armadura e deixou à mostra o corpo forte, repleto por cicatrizes e queimaduras. Cada marca possuía uma história diferente. O escudeiro, curioso e fascinado pelas cicatrizes do jovem cavaleiro, perguntou-lhe como as havia arranjado. O cavaleiro foi contado-lhe cada história, repleta de guerras e duras batalhas, combates com dragões e feiticeiros. O escudeiro, admirado com as histórias, perguntou-lhe:

- E qual dessas cicatrizes foi a mais dolorosa, meu senhor?

O cavaleiro pensou um pouco, apontou para o peito e disse:

- Esta aqui.
- A de sua primeira batalha?
- Não, a que estou apontando é mais profunda, tão profunda que não se pode nem vê-la.
- E como isso é possível, meu senhor?
- É uma cicatriz que fica no coração, nos sentimentos.
- E como o senhor arranjou-a?
- Num duelo com uma donzela, a princesa do feudo no qual eu sirvo.
- Você duelou com uma dama!? Isso não seria errado?
- Não, jovem tolo, não é um duelo de espadas e batalhas, é de um tipo diferente. Eu mostrava minha honra e minha bravura e tentava abrir caminho até o coração da princesa, mas as defesas dela eram fortes demais. E além disso, como um único e mero cavaleiro ou vassalo poderia conquistar o tão poderoso forte que é o coração de tal princesa?
- E então, meu senhor?
- E então que eu perdi a batalha, um tal príncipe de outro reino conquistou meu tão almejado objetivo, e ainda zombas de minha humilhação. A dor foi grande, maior do que qualquer outra dor de qualquer outra guerra. E o pior é que ela sempre dói, não é como as outras...

   O jovem escudeiro optou pelo silêncio depois de tais palavras, surpreendeu-se pelo fato de que o mero cavaleiro, por mais bom que seja, era também sábio. E a viagem continuou no silêncio, até que o escudeiro o quebrasse mais uma vez...

- E de todas as criaturas, meu senhor, qual foi a mais forte ou a mais difícil de lidar?
- Essa é fácil, o pior monstro que já enfrentei foi eu mesmo.

   O escudeiro ficou calado, tentou compreender as palavras que seu mestre havia proferido. O cavaleiro, reparando o silêncio de seu escudeiro, tentou explicar-lhe...

- Confuso? Acho que todos nós temos um monstro dentro de nós, alguns não o controlam e acabam incorporados por ele, alguns andam com uma parte dele exposta mas a maioria bem controlada, alguns, ainda, o controlam por completo, como eu, e o deixam preso dentro de si. Mas às vezes a fera tenta escapar, às vezes os ferimentos são tão profundos que alcançam a jaula do monstro, então ele escapa pelos ferimentos do coração e vem à tona.
- Eu nunca pensei dessa forma, senhor. Mas agora consigo ver com mais clareza.
- Esse é o problema meu jovem, ninguém nunca pensa, eles só gostam de agir.

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