segunda-feira, 19 de novembro de 2012

SOBRE TRAUMAS, SURPRESAS E DEFORMAÇÕES

Os casais andam pelas ruas de mãos dadas,
E eu passo por eles dando a mão à mim mesmo.
Olho para eles com um pouco de raiva, de inveja, de ciúmes,
Eu que tanto desejo um amor,
E meu coração recusa-se cada vez mais a bater.
Ele parece um animal assustado, uma criança traumatizada,
Depois de tantos sustos e acidentes com esse tal de amor,
Ele anda meio assim, com medo.
Mas convenhamos que o amor é assustador,
Convenhamos que é perigoso e arriscado,
Mas talvez seja justamente por isso que gostamos dele.
E eu que só agora fui notar os olhos assustadores do amor,
Surpreendo-me por perceber que não o conheço todo,
Na verdade eu talvez o desconheça por completo.
Porque eu já fui desses cheios de amor,
E justamente por ter amor demais
Eu achava conhecê-lo melhor do que qualquer um,
E talvez seja daí a minha ruína.
Eu tinha demais pra poder estudá-lo, para poder conhecê-lo,
E pelo pouco que eu conhecia achava conhecê-lo por completo,
Quando na verdade ele não tem que ser apenas conhecido como também vivido.
E daí fez-se a maior de todas as pedras desmoronadas dessa ruína,
A ilusão quebrou-se em cacos grandes demais para eu segurar,
Mas mesmo assim eu os metia a mão,
Porque queria salvá-la (a ilusão) de qualquer forma possível.
Por isso me foram decepadas as mãos que cuidam,
Os pés que correm atrás
E a língua que não nega a verdade.
Me foi perfurado o pulmão que prende o ar quando ela passa,
O cérebro capaz de compreender e entender o outro
E o coração capaz de amar.
E disso sobraram-me apenas os olhos.
Eu nada posso fazer senão me olhar no espelho
E chorar todas as minhas deformações,
Chorar todas as minhas cicatrizes
E as partes de mim que estão faltando,
Esquecidas num passado não muito distante.
Nada me resta senão olhar para as pessoas à minha volta,
Olhar todos os que vem e vão sem poder fazer ou dizer nada.
Nada me resta senão olhar os passam,
Da mesma forma que olho os casais de mãos dadas que agora passam nessa rua.

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